Benção de Casa

CELEBRANDO A BÊNÇÃO DE UMA CASA

Marcelo Guimarães
Penha Carpanedo

O livro dos Atos dos Apóstolos bem mostra como a casa tinha um significado particular na vida das primeiras comunidades: em At 2,46 e At 5,42, os discípulos freqüentam, junto com o templo, as casas, onde partilham as refeições e anunciam o evangelho. Para os primeiros cristãos, a casa é o local mais importante do culto, e em pouco tempo, ela se torna o único lugar de reunião dos cristãos. As cartas de São Paulo seguem esta direção, ao mostrar que a Igreja é uma comunidade de cristãos que se reúne numa casa, seja a de Prisca e Áquila (Rom 16, 5; 1Cor 16,19), a de Ninfas (Cl 4,15) ou a de Filêmon (Fm 2). Pela descrição paulina, a Igreja é uma igreja doméstica (domestica ecclesia)!

Mesmo depois que as comunidades crescem e passam a se reunir numa casa própria - a casa da comunidade (domus ecclesiae) -, a casa permanece como referência fundamental. E, mesmo mais tarde, quando as basílicas e as catedrais passam a dominar  o imaginário cristão, ainda que impropriamente[1], estas construções passam a ser referenciadas como a casa de Deus, mostrando a força do paradigma doméstico.

Na tradição patrística, percebe-se um esforço dos pais da Igreja em preservar esta concepção. Assim, São João Crisóstomo (+ 407) ao comentar o livro do Gênesis, exorta a comunidade a fazer de sua casa uma igreja, sendo aplaudido entusiasticamente (In Gen, Hom. 2,4). Ele estimula seus ouvintes a fazer das casas um céu, porque "onde o marido, a mulher e os filhos vivem na concórdia, na afeição e estão ligados pelos laços da virtude, aí reside o Cristo" (Hom 7,5). Ao comentar a carta as efésios, ele cunha a expressão que depois se torna clássica, - ecclesíola -, ao dizer que "a casa é com efeito uma pequena Igreja" (In epist. ad eph., Hom 20,6).

Talvez uma das perdas mais significativas na liturgia católica - junto com a consciência do sacerdócio comum - tenha sido, nos últimos séculos, o papel da liturgia doméstica na santificação dos fiéis. Enquanto o judaísmo ainda conserva a ceia familiar no sábado e a ceia pascal, ao menos no panorama geral do catolicismo, a referência litúrgica principal é o culto comunitário, muito centrado no sacerdócio ministerial. Provavelmente uma valorização do sacerdócio comum, tal como proposta há 40 anos pela Sacrossanctum Concilium, passasse pelo resgate da casa como Igreja.

Neste contexto, a bênção de uma casa assume o significado de bênção de uma igreja, isto é, de uma célula básica da vida evangélica, onde se testemunham todas suas dimensões como o anúncio da Palavra, a celebração da vida, o serviço da solidariedade. A casa, nesta perspectiva, além de ícone da Igreja - a Igreja é uma casa e a casa é uma Igreja -, também aponta para a imagem de uma nova humanidade.

No rito proposto a seguir para a bênção de uma casa, a escolha do esquema do Ofício Divino das Comunidades não se fez por acaso, uma vez que esta proposta de oração apresenta-se como um referencial importante também para a liturgia doméstica. Também foram tomados alguns elementos da bênção de uma Igreja - como a iluminação ou a entrega da Palavra -, para realçar que a casa onde habitam cristãos é uma pequena Igreja. Assim, sugere-se que se abençôe, junto com as pessoas que habitam na casa - os sacerdotes do culto divino doméstico -, um lugar especial referencial para a oração - uma pequena mesa, com um ícone, a Sagrada Escritura, velas, etc. A bênção e partilha de alimentos dá uma dimensão eucarística a rito, enquanto a bênção da família e a aspersão de água benta sobre todos e tudo coroa a celebração.

Pode-se usar o rito abaixo em diversas ocasiões: quando se muda para um local novo de residência, quando um acontecimento faz a família assumir com renovado vigor a vida evangélica, ou mesmo anualmente, como forma de animação da vida eclesial familiar.





ROTEIRO



Abertura

- Vem, ó Deus da vida, vem nos ajudar!

Vem, não demores mais, vem nos libertar!

- Ó que coisa boa nesta casa estar,

Bem que valeu a pena tanto se lutar.

- Desça a tua bênção sobre esta casa

Derrama o teu amor, a tua força e graça.

- Hoje nesta casa chegue a salvação,

Sejam sempre acolhidos toda irmã e irmão.

- Glória ao Pai, e ao Filho e ao Santo Espírito.

Glória à Trindade Santa, glória ao Deus bendito!

- Aleluia, irmãs, aleluia, irmãos!

Povo de sacerdotes, a Deus louvação.



Recordação da vida

A paz esteja nesta casa!

Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!
(Pode-se lembrar os momentos significativos da vida dos habitantes da casa ou da luta para obter a nova residência...)



Acendimento da vela

(A mãe pode, neste momento, acender uma ou mais velas. Levantando uma delas - ou entregando-a para  ministro -, pode assim proclamar:)

A luz de Cristo brilhe sempre nesta casa

e nos conduza nos caminhos do Evangelho!



Hino

Deus vos salve Deus!

Deus vos salve Deus!

Deus salve esta casa

onde mora Deus!



Deus vos salve, Deus!

Deus vos salve, Deus!

Deus salve as pessoas

onde mora Deus!



Deus vos salve, Deus!

Deus vos salve, Deus!

Deus salve o universo

onde mora Deus!



(Ou: Ó gente que casa é esta, ODC, p. 410; Deus te salve, casa santa, ODC, p. 393).



Oração

(O ministro convida a todos a rezar por um instante em silêncio. Depois, pronuncia a seguinte oração:)



Ó Deus, nosso guia e salvador,

em Jesus quiseste erguer tua morada no meio do teu povo,

olha para teus filhos e filhas aqui reunidos.

Atende suas preces e pedidos

e derrama, generoso, o teu santo Espírito.

Consagra esta casa como uma pequena Igreja:

nela, tua Palavra seja acolhida e praticada,

teu nome seja invocado e santificado,

teus pobres sejam recebidos

e o Evangelho de Jesus seja seu fundamento.

Por Ele, nós te pedimos, na unidade do Espírito Santo!



Salmodia

Salmo 84(83)  

Com o cântico dos peregrinos antigos a Jerusalém, cantemos nosso desejo de habitar com o Senhor, na certeza de sermos apoiados por ele.



O passarinho encontrou

agasalho pra seus pequeninos,

o teu altar, ó Senhor,

é abrigo pros teus peregrinos!



1. Como é boa a tua casa,

como é bom morar contigo,

por ti suspira a minh'alma,

meu coração, ó Deus vivo!



Encontrou a andorinha        

ninho para os seus filhotes,

o teu altar, tua casa,

eu encontrei, ó Deus forte!



Bem felizes os que moram

no limiar de tua casa,

os que em ti se apoiam

celebrarão tua graça!



2. Bem feliz quem acha em ti

força para caminhar,

passando por terra seca

em fontes vai transformar.  



Tuas bênçãos vão chover,

tudo vai virar jardim...

Passando sempre mais fortes

em Sião vão ver Deus enfim!



Senhor Deus onipotente,

ouve a prece do teu Cristo,

repara, ó Deus, nossa força,

pra face do teu ungido!



3. Pois um dia em tua casa

vale mais que mil lá fora,    

a conviver com perversos

prefiro estar à tua porta!      



O Senhor é sol e escudo,

graça, glória e alegria,

aos seus nenhum bem sonega,

Feliz quem nele confia!



Glória ao Deus que nos acolhe,

glória ao Cristo salvador,    

e glória ao Santo Espírito

do povos terno louvor!



Salmo 127(126)

Com este antigo canto da sabedoria popular, entreguemos ao Senhor todas as nossas preocupações cotidianas, pedindo que Ele seja o único fundamento da vida dos habitantes desta casa.



1. Se o Senhor não constrói a morada

construtores trabalham em vão,

se o Senhor não guardar a cidade

seus vigias em vão guardarão.



2. Acordar muito cedo é inútil,

ou à noite seu sono atrasar

Pra ganhar o pão duro e sofrido

todo dia vivendo a lutar.



3. O Senhor reservou aos amigos

todo bem necessário à vida.

Mesmo à noite enquanto descansam

não lhes falta nem pão, nem guarida.



4. Um presente de Deus, uma herança,

é o fruto que a mãe traz no ventre

como flechas nas mãos de um guerreiro

é o filho uma força pra gente.



5. É feliz quem assim se reforça

qual guerreiro se arma de flecha.

Por ninguém ele vai ser vencido

na cidade e nas lutas da terra.



6. A Deus Pai seja todo louvor.

E a seu Filho, Jesus, Salvador,

e ao Espírito Santo também,

na seqüência dos tempos. Amém!.



Salmo 128(127)

Com esta bênção sacerdotal dada às famílias, invoquemos a força do Senhor sobre todo o povo de Deus: que venha sobre nós a sua luz, sua alegria, sua paz!



Felizes os que respeitam

a Deus em seu coração.



1. Por seus caminhos trilhando,

felizes sempre serão!



2. São como vinha fecunda,

felizes sempre serão!



3. Seus filhos, verde touceira!

Felizes sempre serão!



4. Por Deus serão abençoados!

Felizes sempre serão!



5. De Sião Deus os abençoe!

Felizes sempre serão!



6. Verão o bem da cidade!

Felizes sempre serão!



7. Verão seus filhos e netos!

Felizes sempre serão!



8. Seu povo a viver em paz!

Felizes sempre serão!



9. Co'o Pai, o Filho e o Divino

Felizes sempre serão!



Proclamação do Evangelho

(Um membro da casa entrega o livro das Sagradas Escrituras para quem vai proclamá-lo. Este o toma e diz:)

A Palavra de Deus ressoe sempre nesta casa:

revele o mistério de Cristo

e guie no caminho da salvação!



(Canta-se um aleluia e segue-se a proclamação do evangelho.)



Mt 7, 24-25:  "A casa construída sobre a rocha".

Todo aquele, portanto, que ouve estas minhas palavras e as põe em prática, será como um homem prudente, que construiu sua casa sobre a rocha. Caiu a chuva e vieram as enchentes, sopraram os ventos e deram contra a casa, mas ela não desabou. Estava fundada na rocha.



Ou:



Lc 19, 1-10: "Hoje a salvação entrou nesta casa".



Lc 24, 28-32: "Permanece conosco, Senhor!".



Lc 10, 5-9: "A paz esteja nesta casa".



Lc 10, 38-42: "Marta e Maria recebem Jesus".



Partilha da Palavra



Responso

Ó Senhor eu não sou digno(a)

De que entres em minha casa

Mas ordena com tua Palavra

E teu servo será curado. __

(melodia: Cristo padeceu...)



Ou:

O Senhor é minha luz e salvação,

O Senhor é minha luz e salvação!



1. Só uma coisa peço ao Senhor

Sempre pedirei

É morar na casa do Senhor por toda a vida

Todos os meus dias.



2. Vou oferecer um sacrifício

Sobre o seu altar

Com louvor e canto eu irei ao Senhor,

Para o bendizer.



3. O Senhor protege a minha vida

A quem temerei?

Se todo um exército virá contra mim,

eu não temerei.



Preces

Façamos nossas preces ao Cristo, Filho de Deus, que nasceu de Maria e habitou entre nós:

(Todos rezam em silêncio por um instante.)



Senhor, tende piedade de nós! Senhor, tende piedade de nós!

Ó Cristo, tende piedade de nós! Ó Cristo, tende piedade de nós!

Senhor, tende piedade de nós! Senhor, tende piedade de nós!



Santa Maria, mãe de Deus – rogai por nós!

São Miguel

Santos Anjos de Deus

São João Batista

São José

São Pedro e São Paulo

(Invocam-se os santos padroeiros e de devoção)

Todos os Santos e Santas de Deus



Ó Senhor, sede nossa salvação – ouvi-nos, Senhor!

Pela vossa encarnação

Pela vossa morte e ressurreição

Pela vinda do Espírito Santo

Libertai-nos do pecado e da opressão

Acolhei o clamor dos oprimidos

Ensinai-nos a vivermos na partilha

Que haja terra para todos os sem terra

Que haja casa para todos os sem casa

Que haja pão para todos os sem pão

Que haja paz para todas as nações

Renovai toda a Igreja no Evangelho

Congregai as Igrejas para o Reino

Para que nos confirmeis em nossa vocação



Jesus Cristo, ouvi-nos!

Jesus Cristo, atendei-nos!



Bênção dos alimentos

Nós te damos graças, ó Deus da Vida,

porque nos escolhestes desde a criação do mundo

para sermos santos diante de tua face.

Tu nos acolhes na comunhão do teu amor,

fortalece-nos com a Palavra do Evangelho

e guias nossos passos no caminho da paz!



Glória a ti, Senhor, graças e louvor!



Como Jesus que, muitas vezes,

reuniu-se com os seus para comer e beber juntos,

revelando que o teu reino havia chegado,

nós também nos alegramos na partilha destes alimentos.

Derrama sobre eles e sobre nós o teu Espírito,

e recebe o louvor de todo o universo

e de todas as pessoas que te buscam.



Glória a ti, Senhor, graças e louvor!



Toda a nossa louvação chegue a ti

em nome de Jesus, por quem oramos

com as palavras que ele nos ensinou:



Pai nosso...



Partilha dos alimentos

(Os membros da casa partilham um alimento (bolo, pão...) como sinal de comunhão.)



Bênção

(O ministro estende as mãos sobre as pessoas da casa:)

Abençoa, Senhor, todas as pessoas que irão morar nesta casa:

nunca lhes falte o pão na mesa

e a paz e a alegria da tua presença.

Sê refúgio para os que aqui moram.

Acompanha quem sai e sê hóspede com quem entra.

Caminha conosco, Senhor Jesus, até o dia em que nos conduzirás a casa do Pai.

Amém.



(O ministro reza sobre a água:)

Abençoa, Senhor, esta água,

com a força do teu Espírito:

lembre-nos o batismo

e o Cristo que nos salvou

com sua morte e ressurreição.

Esta casa, aspergida por ela,

se torne lugar de alegria e comunhão,

agora e sempre.

Amém.



(Asperge-se água benta sobre a casa e as pessoas, enquanto se canta:

A nós descei, divina luz! (bis)        

Em nossas almas acendei  

O amor, o amor de Jesus! (bis)



1. Vinde, santo Espírito, e do céu mandai  

Luminoso raio, luminoso raio!        



Vinde, pai dos pobres, doador dos dons,    

Luz dos corações, luz dos corações!



Grande defensor, em nós habitai,    

E nos confortai, e nos confortai!    



Na fadiga pouso, no ardor brandura,

E na dor ternura, e na dor ternura!



2. Ó luz venturosa, divinais clarões,

Encham os corações, encham os corações!  



Sem um tal poder, em qualquer vivente

Nada há de inocente, nada há de inocente!



Lavai o impuro e regai o seco,        

Sarai o enfermo, sarai o enfermo!    



Dobrai a dureza, aquecei o frio,      

Livrai do desvio, livrai do desvio!



3. Aos fiéis, que oram com vibrantes sons,

Dai os sete dons, dai os sete dons!  



Dai virtude e prêmio e no fim dos dias      

Eterna alegria, eterna alegria!



Aleluia! Aleluia! Aleluia! (bis)        

Aleluia! Aleluia! Aleluia! (bis)



Despedida

A paz de Cristo reine em nossos corações,

a palavra de Cristo habite constantemente em nós,

para que tudo que fizermos em palavras e obras,

façamos em nome do Senhor!

Amém!



[1] Ainda que impropriamente, porque se a assembléia cristã, como corpo de Cristo é a casa de Deus, a construção da igreja é a casa da casa de Deus.